A UACS – União das Associações do Comércio e Serviços, em co-organização com a CCP, realizou ontem, dia 16 de outubro, um evento que contou com três painéis onde se discutiram as questões da escassez de mão de obra e de competências que afetam atualmente os mercados de trabalho na União Europeia e no nosso enquadramento nacional, o tema da “Semana dos 4 dias” cujo debate foi recentemente lançado e a temática da igualdade de direitos e deveres no mercado de trabalho, onde foram abordadas as visões, metodologias, desafios e potencialidades da integração de pessoas com deficiência e outros públicos-alvo com maiores dificuldades de inserção no mercado de trabalho, nomeadamente à luz das questões demográficas e da referida escassez de mão-de-obra.
Na sua intervenção, o Presidente da Direção da CCP, João Vieira Lopes, realçou a existência de vários problemas aos quais temos de atender, incluindo ao nível da qualificação, dos rendimentos, da carga fiscal das empresas e da legislação laboral nacional.
Referiu, ainda, a recente assinatura do Acordo em sede de concertação social (Acordo Tripartido 2025-2028 sobre a Valorização Salarial e o Crescimento Económico) e realçou que o problema da falta de mão-de-obra tem por trás um problema demográfico, de envelhecimento da população, que implica um hiato temporal de duas a três gerações para que se possa vir a corrigir, incluindo por via de movimentações populacionais (leia-se, fluxos migratórios).
Salientou, também, o facto de termos de criar condições para a atração e retenção de mão-de-obra, atentos a que existem países com melhores níveis de vida (logo, grandes concorrentes nesse domínio) e que as deficiências de qualificação existentes no tecido empresarial ultrapassam as dos trabalhadores, incluindo o nível da gestão – sendo que houve progressos ao nível da consciencialização para a sua existência, mas sem que ela tivesse tido o respetivo acompanhamento ao nível da concretização. Este é um dos pontos fracos, com impacto na produtividade do país e importa termos consciência disso.
Foi também referido que a dimensão e a escala do tecido empresarial são elementos estruturantes para que se consiga pagar melhores salários (pois consegue enfrentar-se melhor os mercados) e que deveria haver uma majoração clara de projetos conjuntos, em rede, das empresas, nomeadamente ao nível da utilização dos fundos (não se estando a falar de fusões).
Ao nível das políticas de recrutamento (abordadas numa das mesas redondas), salientou que a sua não valorização mostra que o nosso tecido empresarial ainda não está devidamente sensibilizado para a sua importância, devido à esmagadora maioria de micro e pequenas empresas (o oposto acontece com as multinacionais). Esta questão é fulcral, pois os custos de um bom recrutamento diluem-se ao longo da vida útil do trabalhador – deve ser visto como um investimento e não como um custo.
Falando sobre o trabalho desenvolvido em sede de CPCS e à “Semana dos 4 dias”, realçou que nas situações que implicam atendimento pessoal esta alternativa implica aumento de custos, pelo que levanta muitas reservas e tem que se ter sempre em conta a questão da produtividade. Mais importante, no atual momento, é discutirem-se questões como a baixa da carga fiscal para as pessoas e empresas, libertando rendimento líquido disponível e pensar-se em outras componentes que não apenas os salários para se conseguirem trabalhadores nos horários menos apetecíveis, como são os noturnos e nos fins-de-semana. É igualmente necessário ir mais além, pensar-se na questão da habitação, por exemplo.
Em suma: é necessário aliviar-se a pressão fiscal, sobretudo a que afeta trabalhadores e empresas, sendo que o Acordo firmado não contempla o suficiente, mas a CCP apoiou-o no contexto específico em que nos encontramos: para apoiar a governabilidade. Importa, ainda, debruçarmo-nos sobre questões do Código do Trabalho como o banco de horas (que até é reconhecido e apoiado como um elemento de flexibilidade por um grande número de trabalhadores, nele interessados), rever as baixas não declaradas (instrumento que não funcionou), enfim: encontrarem-se soluções práticas e realistas para problemas que têm verdadeira urgência no domínio do bom funcionamento do mercado de trabalho.
A encerrar esta iniciativa esteve o Vice-Presidente Executivo da CCP, Vasco de Mello, que fez uma súmula dos três painéis da mesma, destacando que o mercado de trabalho está a modificar-se de forma radical (algo que estava latente antes do Covid, mas concretizou-se a seguir). O paradigma do desemprego inverteu-se para outro, em que necessitamos da imigração e de reter estes trabalhadores (não apenas de reter os nossos jovens): na verdade, se o poder de negociação era do empregador, agora passou para o trabalhador e na negociação em sede de concertação social fala-se muito em direitos laborais.
Relativamente à questão da escassez e da atração, foram referidos alguns exemplos concretos, sendo esta uma situação complexa de solucionar. Os mais qualificados podem ser atraídos também pela fiscalidade, não tem de ser apenas pelos salários. Por outro lado, a longevidade da vida ativa mudou, logo, o prazo das reformas prolongou-se, o que também leva a que todos os paradigmas mudem a este nível – mas este tema é tabu na concertação social, ao contrário de outros como a “Semana dos 4 dias”, não obstante as questões que levanta em termos de produtividade e da robotização.
Finalmente, e porque no terceiro painel se falou na igualdade de género, foram citados os exemplos do BCP e do sistema judicial português, em que se assistiu a um grande aumento do número de mulheres, tendo o orador considerado que na justiça haverá também um novo paradigma, pois a visão dos magistrados e da Procuradoria vai ser completamente diferente: temos, enfim, que compreender que estamos num “admirável” mundo novo!